De mansinho ela entrou, a minha filha. A madrugada entrava como ela, mas não tão de mansinho. Os pés descalços, de ruído menor que o do meu lápis e um riso bem maior que o dos meus versos. Sentou-se no meu colo, de mansinho. O poema invadia como ela, mas não tão mansamente, não com esta exigência tão mansinha. Como um ladrão furtivo, a minha filha roubou-me a inspiração, versos quase chegados, quase meus. E mansamente aqui adormeceu, feliz pelo seu crime. Ana Luisa Amaral
Entrevista a Herberto Hélder (na foto) por Fernando Ribeiro de Mello, publicada do Jornal de Letras e Artes n.º 139, de 17 de Maio de 1964. «Os cinco livros que até hoje publiquei pouco significam agora para mim!» - Diz-nos desassombradamente Herberto Helder Herberto Helder, cujo último livro, «Electronicolírica», veio levantar sérios problemas em volta do conceito que a sua poética parecia anunciar acaba de publicar em conjunto com António Aragão e vários o colaboradores o caderno «Poesia Experimental» que vem confirmar a viragem operada na sua obra. Fernando Ribeiro de Mello/ Jornal de Letras e Artes – Como considera criticamente a evolução da sua produção poética, desde «O Amor em Visita» ao recentemente publicado «Electronicolírica»? Herberto Helder – Em certo sentido (que também prezo), não houve evolução. Esse sentido é o de fidelidade às bases da minha experiência – a descoberta do modo – que, fundamentalmente, se cumpriu na infância. A experiência exterior poderá ser consider...
Conduzia na estrada do Barranco do Bebedouro - serpenteada, estreita, iluminada pela lua cheia. De repente, um vulto na minha rota. Não pude evitar. Só o vi pelo retrovisor. Saí do carro e ajoelhei-me junto do animal, um rafeiro alentejano, lindo, que ainda me olhou nos olhos e disse baixinho: - É pá, mataste um cão sem dono. A lua cheia inundava o silêncio e eu levei-o ao colo para dentro do carro. Quando cheguei a casa, só pude fazer o que fiz. Chamei o Dique e encarreguei-o de convocar todos os cães da aldeia. O funeral foi marcado para a meia noite. Todos compareceram. Solidários, quatro amigos mais corajosos ofereceram-se para cavar a sepultura, num canto da horta, onde espontâneas medravam hortelãs. Todos reunidos no silêncio. Um uivo comovido despoletou um choro colectivo. Só o Dique não chorou. Trazia na boca uma papoila que largou em cima da sepultura. Eufrázio Filipe in http://mararavel.blogspot.pt/
Comentários
Obrigada Adelaide por esta pérola.
As pérolas são um elemento orgânico e natural e precisam de "respirar" assim o fez a Mariah, obrigada.
Saudade é como viajar
Num barco que se perdeu
E a vontade de marear
Merce que se pense no Eu
Pensar no Eu é esquecer
Que não há separatividade
Que todos provimos do SER
Que está alem da eternidade
E somos apenar manifestações
Dessa Causa sempre Incausada
Nessa busca em nossos corações
Pó das estrelas nessa estrada
Deixa-te ir mais além um pouco
Invadir pela música das esferas
Ama e torna a amar, não és louco
Só o amor percorre todas as eras
Um pequeno presente para si.
Um abraço
José António